• Home
  • Posts RSS
  • Comments RSS
  • Edit
Blue Orange Green Pink Purple

"A vida é exatamente mudança".

*Armando Nogueira

Eu, repórter, por Luís Fernando Veríssimo

Reminiscências, reminiscências... Trabalho em jornal há mais de 40 anos mas uma única vez saí da redação para fazer uma reportagem. Dizem que só o repórter é jornalista mesmo, no sentido em que só quem está na linha de frente é soldado mesmo – o resto é burocracia fardada. Pois fui repórter por um dia, em 1968. O sul-africano Christian Barnard, que meses antes fizera o primeiro transplante de coração da História, viria participar de um congresso em Buenos Aires. Eu fazia de tudo na redação do jornal Zero Hora, de Porto Alegre. Até, como já contei mais de uma vez, o Horóscopo. Quando faltavam artigos para a página de opinião eu fazia, usando pseudônimos. Certa vez dois dos meus pseudônimos polemizaram violentamente, pois tinham opiniões radicalmente opostas sobre determinado assunto. Eu também fazia um guia de bares e restaurantes da cidade e vez que outra inventava personalidades que os frequentavam (o conde italiano Ettore Fanfani, o empresário e bom vivant Aldo Gabarito) e davam seus palpites. Quer dizer, nada menos sério e mais longe da reportagem do que minha enclausurada atividade jornalística na época. Mas eu falava inglês, e fui o escolhido para entrevistar o Barnard. Me botaram num avião para Buenos Aires. Junto com um cinegrafista, o Leca, porque a matéria que eu conseguisse também seria para a TV.
O dr. Barnard se tornara uma celebridade mundial com seu feito. Havia uma multidão querendo entrevistá-lo em Buenos Aires. Ele atenderia a imprensa de uma vez só, numa coletiva, e depois responderia a perguntas individuais – mas só uma pergunta por repórter. Entrei na fila. O Leca ficaria perto do doutor e ligaria a câmera quando eu chegasse lá. Fiquei pensando no que perguntar ao Barnard. O argentino atrás de mim me cutucava com seu microfone à altura dos rins. Ouvi uma altercação vindo do começo da fila. Um repórter desobedecera ordens, tentara fazer uma segunda pergunta ao cirurgião e ouvia protestos dos colegas. Eu não conseguia pensar na pergunta que faria ao Barnard. Tinha que ser uma única pergunta. Uma pergunta definitiva.
– O que o senhor está achando de Buenos Aires?
Não! Algo mais científico. Como está passando o paciente que recebeu o coração transplantado? Não! O paciente poderia já ter morrido, a pergunta seria vista como provocação. Falar do apartheit na África do Sul? Não, nada a ver.
Perguntar o quê?
Eu chegava cada vez mais perto do começo da fila. O Leca me fazia sinal de positivo, estava a postos. A ansiedade do argentino atrás de mim aumentava e as cutucadas também. Perguntar o quê?
Finalmente cheguei na frente do dr. Barnard e...
Sabe que eu não me lembro o que perguntei? Tenho a vaga lembrança de alguma coisa como “O senhor espera operar num brasileiro, um dia?” mas prefiro estar enganado. Minha única vontade era estar de volta na redação do Zero Hora, inventando frases para o conde Fanfani ou o Aldo Gabarito, em vez de para mim.
Desde então, só aumentou a minha admiração por repórteres.
Luís Fernando Veríssimo - Colunista do jornal O Globo (vários jornais do país) - texto publicado na edição de 09/04/09 e retirado do site Comunique-se.
Read More 1 Comment | Postado por Caroline Rocha | edit post

1 Comment

  1. Unknown on 12 de abril de 2009 às 11:39

    Carol, o texto é muito interessante e revela bem algumas condições da profissão de jornalista. Tem que ralar muito e esquecer tudo a volta em busca da notícia.

     


Postar um comentário
Postagem mais recente Postagem mais antiga Página inicial

Diniz Neto

Maringá

Maringá
Maringá, vista do centro, com o prédio mais alto e a Catedral, cartão postal da cidade. Foto de Vardir Carniel. (44) 9961-2202

Blogs e sites

  • Brainstorm #9
    Consumidor prefere anúncios na Amazon e ponto de venda; profissionais de marketing apostam em Instagram e influencers
    Há 22 horas
  • Maringá Histórica
    O boa praça, Frank Silva
    Há 4 anos
  • Carlão Maringá
    A PRF alerta para a existência de aplicativos falsos
    Há 7 anos
  • Fábio Campana
    Adriana Sydor, toda prosa
    Há 9 anos
  • Oséias Miranda
    Maringaenses formam filas para conseguir água
    Há 9 anos
  • Só na palavra
    Honda S2000 Review
    Há 10 anos
  • CBN - Mílton Jung
  • Pesquisa






    • Home
    • Posts RSS
    • Comments RSS
    • Edit

    © Copyright BLOG DINIZ NETO. All rights reserved.
    Designed by FTL Wordpress Themes | Bloggerized by FalconHive.com | Blogger Templates
    brought to you by Smashing Magazine

    Back to Top